terça-feira, 30 de outubro de 2007

2.3.2. Matriz principal da New Age

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2.3. Princípios fundamentais do pensamento da Nova Era

2.3.2. A matriz principal do pensamento da Nova Era

A matriz essencial do pensamento da Nova Era deve ser buscada na tradição esotérico-teosófica que gozou de grande aceitação nos círculos intelectuais europeus dos séculos XVIII e XIX. Em particular, vigorou na maçonaria, no espiritismo, no ocultismo e na teosofia, que compartilhavam uma espécie de cultura esotérica. Nesta cosmovisão, o universo visível e o invisível estão vinculados por uma série de correspondências, analogias e influências entre o microcosmos e o macrocosmos, entre os metais e os planetas, entre os planetas e as diversas partes do corpo humano, entre o cosmos visível e os âmbitos invisíveis da realidade. A natureza é um ser vivo, atravessado por uma rede de simpatias e antipatias, animado por uma luz e um fogo secreto que os seres humanos procuram controlar. As pessoas podem conectar-se com os mundos superior ou inferior mediante sua imaginação (órgão da alma ou espírito) ou então recorrendo a mediadores (anjos, espíritos, demônios) ou rituais.As pessoas podem ser iniciadas nos mistérios do cosmos, Deus, ou o eu, por meio de um itinerário espiritual de transformação. A meta última é a gnose, a forma superior de conhecimento, equivalente a salvação. Implica numa busca da mais antiga e elevada tradição da filosofia (o que se chama, de modo inapropriado, philosophia perennis) e da religião (teologia primordial), doutrina secreta (esotérica) que é a chave de todas as tradições “exotéricas” acessíveis a todos. Os ensinamentos esotéricos se transmitem de mestre para discípulo num programa gradual de iniciação.Alguns vêem o esoterismo do século XIX como algo totalmente secularizado. A Alquimia, a magia, a astrologia e outros elementos do esoterismo tradicional se tinham integrado completamente com aspectos da cultura moderna, incluindo a busca das leis causais, o evolucionismo, a psicologia e o estudo das religiões. Alcançou sua forma mais clara nas idéias de Helena Blavatsky, uma médium russa que, junto com Henry Olcott, fundou a Theosophical Society em Nova York em 1875. Esta sociedade tinha por objetivo fundir elementos das tradições orientais e ocidentais em uma forma de espiritismo evolucionista. Tinha três objetivos principais:1. “Formar um núcleo da Fraternidade Universal da Humanidade, sem distinção de raça, credo ou cor”.2. “Promover o estudo comparativo das religiões, a filosofia e a ciência”.3. “Investigar as leis desconhecidas da Natureza e os poderes latentes do ser humano”.“O significado desses objetivos... deveria estar claro. O primeiro objetivo nega implicitamente o “fanatismo irracional” e o “sectarismo” do cristianismo tradicional tal como o concebem os espiritistas e os teósofos... O que não é imediatamente evidente nestes objetivos é que para os teósofos a “ciência” significava as ciências ocultas, e a filosofia, a occulta philosophia. Para eles, as leis da natureza eram de índole oculta ou psíquica e esperavam que a religião comparativa desvelasse uma “tradição primordial” modelada, em último termo, a partir de uma philosofia perennis hermética”.Um componente destacado dos escritos de Madame Blavatsky era a emancipação da mulher, o qual implicava um ataque contra o Deus “masculino” do judaísmo, do cristianismo e do Islã. Convidava a voltar à deusa mãe do hinduísmo e à prática das virtudes femininas. Estas idéias continuaram sob a orientação de Annie Besant, que se achava na vanguarda do movimento feminista. Na atualidade, a Wicca (cf. o termo no glossário do parágrafo n. 7) e a “espiritualidade das mulheres” continuam esta luta contra o cristianismo “patriarcal”.Em sua obra The Aquarian Conspiracy, “A conspiração do Aquário”, Marilyn Ferguson dedicou um capítulo aos precursores da Era de Aquário, aqueles que haviam tecido uma visão transformadora baseada na expansão da consciência e na experiência da auto-transcendência. Dois dos mencionados são o psicólogo americano William James e o psiquiatra suíço Carl Gustav Jung. James definiu a religião como experiência, não como dogma, e ensinou que os seres humanos podem mudar suas atitudes mentais a fim de converter-se em arquitetos de seu próprio destino. Jung destacou o caráter transcendente da consciência e introduziu a idéia do inconsciente coletivo, uma espécie de depósito de símbolos e recordações partilhadas com pessoas de diversas épocas e culturas diferentes. Segundo Wouter Hanegraaff, ambas personagens contribuíram para a “sacralização da psicologia”, que se converteu em um elemento fundamental do pensamento e da prática da Nova Era. De fato, Jung “não só psicologizou o esoterismo, mas também sacralizou a psicologia, enchendo-a dos conteúdos da especulação esotérica. O resultado foi um corpo de teorias que permite falar de Deus quando na realidade se quer falar da própria psique, e falar da própria psique quando na realidade se quer falar do divino. Se a psique é “mente”, e Deus também é “mente”, então falar de uma coisa significa falar da outra”. À acusação de ter “psicologizado” o cristianismo responde que “a psicologia é o mito moderno e só podemos entender a fé nestes termos”. Certamente, a psicologia de Jung lança luz sobre muitos aspectos da fé cristã, especialmente sobre a necessidade de enfrentar a realidade do mal. Porém suas convicções religiosas são tão diferentes ao longo das diversas etapas de sua vida, que a imagem de Deus que se depreende é sumamente confusa. Um elemento central de seu pensamento é o culto ao sol, onde Deus é a energia vital (libido) do interior da pessoa. Segundo afirmou ele mesmo “esta comparação não é um mero jogo de palavras”. Este é “o Deus interior” ao que se refere Jung, a divindade essencial que ele acreditava existir em todo o ser humano. O caminho para o universo interior passa através do inconsciente e a correspondência do mundo interior com o exterior reside no inconsciente coletivo.A tendência a intercambiar a psicologia e a espiritualidade foi retomada pelo Movimento do Potencial Humano quando este se desenvolveu no final dos anos sessenta no Instituto Esalen da Califórnia. A psicologia transpessoal, fortemente influída pelas religiões orientais e por Jung, oferece um caminho contemplativo onde a ciência se encontra com a mística. A ênfase que se coloca na corporeidade, a busca de métodos para expandir a consciência e o cultivo dos mitos do inconsciente coletivo eram todos incentivos para buscar o “Deus interior” dentro de si mesmo. Para realizar o próprio potencial seria necessário ir além do ego individual a fim de converter-se no deus que cada um é no mais profundo de si mesmo. Isto se podia realizar escolhendo a terapia adequada: a meditação, as experiências parapsicológicas, o uso de drogas alucinógenas. Todos estes eram os caminhos para chegar a “experiências culminantes”, experiências “místicas” de fusão com Deus e com o cosmos.O símbolo de Aquário, tirado da mitologia astrológica, chegou a converter-se na expressão do desejo de um mundo radicalmente novo. Dois centros que constituíam o centro propulsor inicial da Nova Era (e que continuam sendo-o até certo ponto) eram a Comunidade Jardim de Findhorn, no Nordeste da Escócia, e o Centro para o Desenvolvimento do Potencial Humano de Esalen, em Big Sur, Califórnia, nos Estados Unidos. No entanto, o que mais alimenta a difusão da Nova Era é o desenvolvimento de uma progressiva consciência global e a percepção crescente de uma crise ecológica iminente.

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